PCP repudia pressões e chantagens<br>e exige respeito pela soberania
O PCP reiterou a sua rejeição e repúdio pelas ameaças e chantagens provenientes da União Europeia, defendendo que «é preciso dizer basta».
O povo português tem o direito de lutar pelos interesses nacionais
É inaceitável que sobre o País continue a pairar toda a espécie de ingerências externas, «em nome de uma agenda ideológica que pretende subjugar os países mais frágeis e condenar os seus povos ao empobrecimento em benefício dos interesses económicos e financeiros que dominam as instituições da União Europeia», sublinhou o deputado comunista António Filipe, dia 29, numa declaração política proferida em nome da sua bancada no Parlamento.
Aludindo às declarações de Jeroen Dijsselbloem, presidente do Eurogrupo, o parlamentar comunista foi directo ao que é politicamente relevante assinalando que «não chega dizer» que tal personagem não tem condições para continuar no exercício do cargo. «O que é preciso é dizer aos senhores que mandam no Eurogrupo, na Comissão Europeia, no BCE e na Direcção Geral da Concorrência que Portugal não é uma república das bananas. É um Estado soberano, habitado por um povo que reivindica o seu direito à autodeterminação e ao desenvolvimento, que tem o direito de lutar pelos seus interesses nacionais, que tem direito a uma vida digna, que merece um mínimo de respeito e que não pode aceitar a submissão ignomiosa a que o pretendem sujeitar no quadro de uma União Europeia cada vez mais distante das ideias de coesão social que alegadamente visava prosseguir», sublinhou em tom veemente António Filipe.
Alvo de crítica em toda a linha foram assim não apenas as «afirmações insultuosas» do presidente do Eurogrupo, que o PCP vê como um «acto não isolado», mas sim todas as pressões e ameaças a que o País tem sido sujeito por parte da União Europeia.
É disso testemunho a posição do BCE que não obstante o cumprimento das metas do défice público em 2016, logo veio dizer não ser isso afinal suficiente para «tirar Portugal do radar das ameaças», alegando a subsistência de «desvios significativos no défice estrutural».
«A intolerável ameaça de sanções que se julgava ter saído definitivamente pela porta volta a entrar pela janela, agora com o pretexto dos desequilíbrios macro-económicos e acompanhada como sempre da ladainha repetitiva das "reformas estruturais"», denunciou António Filipe, não escondendo a sua indignação por neste processo de chantagens e ameaças valer quase tudo.
Trazidos à colação pelo deputado do PCP foram ainda outros exemplos que atestam esta lamentável realidade, como é o caso da posição assumida por aqueles que admitem que a recapitalização da Caixa Geral de Depósitos possa ser afinal contabilizada no défice - e com isso o País seja impedido de sair do «procedimento por défice excessivo». «O PSD e o CDS vieram levantar essa hipótese e não esconderam o seu regozijo, ainda que para já tenha sido um falso alarme», acusou, anotando com ironia que «ainda não foi desta que o diabo saiu de trás da porta».
A justificar a indignação da bancada comunista esteve ainda o mais recente relatório da Comissão Europeia, levantando «uma incerteza quanto à meta do défice público, no valor estimado de 760 milhões de euros», com António Filipe a não deixar passar a circunstância de tal demanda vir de quem vem, ou seja, de uma entidade que demonstrou a sua «total falta de credibilidade no que diz respeito às contas que faz sobre Portugal».
A tudo isto acresce o que foi por si classificado de «grosseira ingerência da Direcção-Geral da Concorrência», que «não satisfeita por ter coagido o Estado português a oferecer o Banif ao Santander à custa dos contribuintes portugueses, pretende agora impor uma solução para o Novo BNanco mais uma vez à custa do mais elementar interesse nacional».
O debate que urge aprofundar
O deputado do PS Eurico Brilhante Dias assumiu divergências com o PCP em matéria europeia, mas disse haver também convergências, nomeadamente no que toca à constatação da existência (do ponto de vista das instituições europeias) de um «preconceito que levou à aplicação de austeridade em cima de austeridade».
Na resposta, e perante o sintomático silêncio das bancadas do PSD e do CDS, que se demitiram de colocar qualquer questão, António Filipe fez notar que nos discursos até é fácil obter entendimento, dando como exemplo a circunstância de «todos falarem numa Europa de paz, de cooperação, que respeite a vontade popular, que respeite a soberania dos povos e o seu direito à autodeterminação e ao desenvolvimento, uma Europa que promova a coesão económica e social».
A grande questão está porém em saber, olhando para a União Europeia e para o processo de integração, se esses valores têm tradução prática, se tem sido isso que tem marcado a vida dos povos europeus. «Não, não é isso», respondeu, observando que o «discurso europeísta dominante continua a insistir na ideia de que a resolução da profunda crise por que passa a União Europeia se resolve com mais do mesmo, com mais uma fuga para a frente.
Ora, «não é por aí que os problemas se resolvem», sublinhou António Filipe, que não deixou ainda de comentar a ideia expressa pelo deputado do PS segundo a qual o projecto europeu que este diz ser o seu não é aquele a que estamos a assistir. E a este propósito, marcando as diferenças de visão que separam as duas bancadas, inquiriu: «Mas tem havido outro? É possível neste quadro de aprofundamento do que tem sido a UE resolver os problemas insistindo mais e mais nos gravíssimos erros que levaram à situação que se vive hoje?»
Daí o PCP entender que «isto não pode deixar de ser questionado e que o discurso de "mais Europa, mais Europa" não resolve nenhum dos problemas, nem os nacionais nem os da UE», sublinhou o deputado comunista, que, já em resposta a José Luís Ferreira (que reclamara a necessidade do debate sobre as opções do nosso País no quadro da UE), concordou com a necessidade urgente de aprofundar esse debate. «Esse debate é incontornável e os problemas não se resolvem com ideias feitas e discursos que invocam aquilo que a UE sempre disse se,r mas que na realidade nunca foi e é cada vez menos», sustentou.
PSD e CDS-PP sem razão
O anúncio de que o défice público ficou em 2,1% do PIB, cumprindo integralmente as exigências formais da UE, não deixou também de ser comentado por António Filipe, que disse não ver o PCP nesse cumprimento «motivo de congratulação».
E a razão é simples. É que essa opção pela redução do défice teve como consequência a «compressão do investimento, as restrições nos serviços públicos e a demora na reposição dos direitos dos trabalhadores».
Mais, não fossem as restrições em matéria de défice público impostas pela UE e os «encargos de uma dívida impagável» e, na óptica do PCP, o cenário poderia ser outro bem diferente: «os portugueses poderiam viver significativamente melhor, com melhores salários, mais investimento, melhores serviços públicos e mais justiça social».
António Filipe ressalvou, porém, que o facto de o PCP não se congratular «não dá razão ao PSD e ao CDS-PP». É que, sublinhou, «quem impôs sacrifícios tremendos aos trabalhadores e às camadas sociais mais desprotegidas em nome de uma redução do défice que era preciso atingir custe o que custasse, quem aumentou impostos, cortou salários, pensões direitos e investimento - e nem sequer atingiu os objectivos que se propunha de redução do défice - não tem nenhuma autoridade política para criticar, muito menos quando utiliza o défice como pretexto para criticar as medidas de reposição de direitos e rendimentos».
Aliás, na perspectiva do deputado comunista, a política de reposição de rendimentos estaria sempre sob fogo do PSD e CDS-PP, «sempre presa por ter cão e por não ter». Porquê? «Não cumprindo as metas do défice seria criticada pelo aumento da despesa e por se manter Portugal no procedimento por défice excessivo. Não havendo incumprimento, é criticada por ter ficado aquém do que seria necessário», explicou.